Da viagem às "suspeitas maldosas" do MP. Sócrates rejeita perigo de fuga
- 02/12/2025
O Ministério Público (MP) questionou a alegada deslocação de José Sócrates aos Emirados Árabes Unidos, por considerar que havia perigo de fuga, após o antigo primeiro-ministro ter revelado que esteve no Médio Oriente. No entanto, o ex-governante já veio dizer que as suspeitas "são maldosas".
As suspeitas do MP começaram após José Sócrates, julgado no processo Operação Marquês, ter afirmado que esteve "duas semanas" no Médio Oriente, durante uma entrevista à CNN Portugal.
"Cheguei ontem, vindo do Médio Oriente, e tinha uma jornalista da CMTV a perguntar-me o que é que eu tinha ido fazer a Abu Dhabi [capital dos Emirados Árabes Unidos] nas últimas duas semanas. Quer dizer, o Ministério Público faz investigações às pessoas que estão em julgamento e fá-lo clandestinamente e depois manda os jornalistas fazer estas perguntas", afirmou na entrevista.
E questionou: "Quem mais saberia que fui, nas últimas duas semanas, ao Médio Oriente? Mais ninguém, não é?"
Já esta terça-feira, o Observador revelou que o MP questionou a alegada deslocação, admitindo que a viagem, a ter acontecido, poderá fazer parte de um plano de fuga e que as medidas de coação podem mudar.
Para o Ministério Público, no requerimento a que a Lusa teve acesso, "não é de excluir que a aludida deslocação do arguido não haja sido comunicada ao tribunal de forma deliberada, eventualmente por se integrar num plano do mesmo que vise permitir-lhe subtrair-se definitivamente ao alcance da justiça nacional".
"A ser verdade que o arguido se deslocou ao Médio Oriente durante o período que mencionou na referida entrevista, é manifesto que terá violado o respetivo estatuto", acrescentou.
Sublinhe-se que José Sócrates, que está a ser julgado por 22 crimes, continua sujeito a termo de identidade e residência que, embora seja a medida de coação menos gravosa, obriga à comunicação de nova residência ou de local onde pode ser encontrado, caso se ausente do país por mais de cinco dias.
Agora, o Ministério Público quer que José Sócrates explique ao tribunal que deslocações fez ao estrangeiro e qual a razão para não terem sido comunicadas. Quer também que a Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros, o Gabinete de Informações de Passageiros e a ANA - Aeroportos de Portugal enviem os registos de entradas e saídas de Portugal do antigo primeiro-ministro.
Caso se confirmem deslocações que não foram comunicadas ao tribunal, o Ministério Público admite que poderão ser revistas as medidas de coação.
Perigo de fuga? "As suspeitas do Ministério Público não são cómicas, são maldosas", defende Sócrates
Em resposta, Sócrates desmentiu que tenha feito viagens ao estrangeiro superiores a cinco dias e negou qualquer perigo de fuga, alegando que sempre regressou a Portugal, mesmo quando foi detido em 2014.
"É completamente falso que tenha feito viagens ao estrangeiro que tivessem excedido o limite de cinco dias a partir do qual sou obrigado a comunicar ao tribunal o local da minha ausência. É falso, ponto final", argumentou Sócrates num esclarecimento enviado à Lusa.
"A manobra, bem entendida, consiste em inverter os termos: eu denunciei os procuradores por serem suspeitos de passar informações a jornalistas sobre a minha vida privada; eles respondem insinuando que tenho feito viagens fora da lei e que isso significa perigo de fuga", criticou, frisando que "as suspeitas do Ministério Público não são cómicas, são maldosas".
Ministra da Justiça garante que "há medidas para acautelar" perigo de fuga
A ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, argumentou, na tarde desta terça-feira, em declarações aos jornalistas, que, "se houvesse receio de fuga de qualquer pessoa que esteja a ser julgada, há medidas para acautelar essa situação".
Recusando comentar o caso específico de José Sócrates, a ministra reiterou: "Se existir alguma suspeita de fuga de qualquer pessoa que esteja a ser julgada, há medidas que têm de ser aplicadas. É só isso".
José Sócrates está acusado de 22 crimes no processo Operação Marquês
José Sócrates, de 68 anos, está pronunciado (acusado após instrução) de 22 crimes, incluindo três de corrupção, por ter, alegadamente, recebido dinheiro para beneficiar em dossiês distintos o grupo Lena, o Grupo Espírito Santo (GES) e o 'resort' algarvio de Vale do Lobo.
No total, o processo conta com 21 arguidos, que têm, em geral, negado a prática dos 117 crimes económico-financeiros que globalmente lhes são imputados.
O julgamento decorre desde 03 de julho no Tribunal Central Criminal de Lisboa, órgão que, em 11 de novembro, esclareceu que os crimes de corrupção relacionados com Vale de Lobo podem prescrever no primeiro semestre de 2026.
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