Alegado testa-de-ferro de Rangel descrito como "pau-mandado" do ex-juiz
- 02/12/2025
Augusto Pinheiro, chamado como testemunha pelo Ministério Público (MP) para explicar as várias transações e movimentos financeiros ao longo dos anos com José Santos Martins, tido pela acusação do MP no processo 'Operação Lex' como sendo o testa-de-ferro de Rui Rangel, descreveu o advogado como "um pau-mandado" do ex-desembargador da Relação de Lisboa.
Para exemplificar, referiu como nos encontros de amigos no seu 'stand' de automóveis ao fim do dia, para jogar à sueca, e do qual Santos Martins fazia parte, sempre que havia uma chamada de Rangel para o advogado este se levantava da mesa para ir ao encontro do ex-desembargador.
Num depoimento com muitos pontos de contacto com a testemunha anterior, Armando Parente, - administrador de uma sociedade comercial de Santos Martins e também parte do grupo de amigos do 'stand'-, Augusto Pinheiro referiu que "se comentava" que o advogado teria uma dívida para com Rangel que teria que pagar.
Armando Parente, o primeiro a depor esta manhã, e que conheceu Rangel por intermédio destes encontros no 'stand', foi mais concreto sobre o tema, afirmando que quando o advogado recebia esses telefonemas "saía, deixava toda a gente" e que o ouviam dizer que "era preciso arranjar dinheiro urgentemente para pagar ao Rangel".
"O que era corrente era que Santos Martins andava sempre aflito para pagar as contas de Rangel, ao ponto de perder quase todo o património" para esse efeito, disse Armando Parente, referindo uma dívida de centenas de milhares de euros, da qual Santos Martins "terá liquidado milhares", acrescentando que o advogado se desfez de carros de luxo, como um Ferrari, de uma casa na Quinta da Beloura, de relógios de grande valor, "tudo vendido ao desbarato".
"Para honrar os seus compromissos teve de o fazer dessa forma", disse.
Sobre as transações de imóveis com Santos Martins, Augusto Pinheiro referiu um empréstimo que 275 mil euros que fez ao advogado para a compra de um apartamento em Vilamoura, e do qual Santos Martins não chegou a tornar-se proprietário, e foi questionado sobre a compra de um apartamento em Almada que seria propriedade de Rita Figueira, arguida no processo e mãe de uma das filhas de Rui Rangel.
O negócio foi descrito por Augusto Pinheiro como "um favor" a Santos Martins, tratando-se de uma compra e venda ficcionada, uma vez que o imóvel foi colocado em seu nome e devolvido a Rita Figueira sem que tenha havido qualquer pagamento envolvido.
O objetivo seria Rita Figueira conseguir um crédito bancário para a recompra ficcionada do imóvel.
"Precisava do dinheirinho", explicou Augusto Pinheiro ao juiz conselheiro Jorge Gonçalves, que pediu esclarecimentos sobre a transação, questionando ainda a testemunha se se incluía nos amigos que Santos Martins estaria "sempre a cravar" para pagar a Rangel, de acordo com o que tinha afirmado anteriormente, o que Augusto Pinheiro confirmou.
Armando Parente explicou que acedeu a ser administrador de uma sociedade comercial de Santos Martins a pedido do advogado, o que aceitou "por amizade e respeito" pela pessoa, não tendo nunca praticado qualquer ato no âmbito das funções, que lhe foram apresentadas como temporárias - mas que durariam anos -, até que Rui Carrera Moura assumisse o cargo.
Justificou ainda as transferências para Santos Martins constantes do processo com o facto de ter descontado livranças em nome do advogado nos bancos, mas questionado pelo procurador Vítor Pinto sobre uma transferência de mais de dois mil euros que teria sido usada para pagar um crédito da Credibom disse não se lembrar.
Explicou ainda que "a situação precária" em termos financeiros de Santos Martins, que viu "sempre a agravar-se", levou a que não lhe pagasse os serviços de advocacia que lhe prestava, assim como à sua família, limitando-se a transferir dinheiro para pagamento de custas judiciais.
O processo Operação Lex foi conhecido em 30 de janeiro de 2018, quando foram detidas cinco pessoas e realizadas mais de 30 buscas e teve origem numa certidão extraída do caso Operação Rota do Atlântico, que envolveu José Veiga.
A acusação do Ministério Público foi conhecida em setembro de 2020 e o inquérito/investigação centrou-se na atividade desenvolvida pelos ex-desembargadores Rui Rangel, Fátima Galante e Luís Vaz das Neves -- que, segundo a acusação, utilizaram as suas funções no Tribunal da Relação de Lisboa para obterem vantagens indevidas, para si ou para terceiros, que dissimularam.
Em causa estão, em geral, crimes de corrupção, abuso de poder, branqueamento de capitais e fraude fiscal, entre outros, e alguns dos arguidos, incluindo Vaz das Neves, têm negado ao longo do processo as acusações.
O julgamento decorre no Supremo Tribunal de Justiça, em instalações do antigo Tribunal Militar de Lisboa, desde 29 de outubro e tem sessões agendadas pelo menos até ao final de janeiro de 2026.
Leia Também: Defesa põe em causa acusação com base em SMS que Vaz das Neves diz que não recebeu



